domingo, 24 de maio de 2015

UKIYO-Ê – A ARTE QUE INFLUENCIOU A TATUAGEM JAPONESA

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..Viver apenas o momento presente, 
entregar-se inteiramente à contemplação da lua, 
da neve, da flor de cerejeira e da folha de plátano ... 
não se deixar abater pela pobreza e não deixá-la 
transparecer em seu rosto, mas flutuando 
como uma cabaça na corrente do rio: 
que é chamado de Ukiyo...

Asai Ryōi - Ukiyo Monogatari 


Foi no período Edo entre os séculos XVII e XIX que surgiu no seio das classes mais baixas da sociedade japonesa um estilo artístico que viria  servir de base para o universo pictórico da tatuagem oriental. Ao contrário dos estilos clássicos como o Yamato-ê que retratava a nobreza e do Sumi-ê que abordava temáticas religiosas, esse novo estilo se voltou para a vida cotidiana mostrando artistas do popular teatro Kabuki, Cortesãs, lutadores de Sumô, mitos populares, paisagem e até cenas eróticas. Seu nome, Ukiyo-ê, ou em bom português “retratos de um mundo flutuante” em alusão ao pensamento budista sobre a efemeridade do mundo.

Derivado da Xilogravura herdada dos chineses, o Ukiyo-ê aparece pela primeira vez na década de 1670 a partir dos trabalhos monocromáticos de Hishikawa Moronobu, um ilustrador e impressor de livros ehon, que passou a vender folhas avulsas com objetivo de baixar custos e tornar seus trabalhos mais accessível a população urbana. Foi somente no século XVIII que surgiu a técnica do nishiki-ê criada por Suzuki Haronobu que permitiu impressões multicoloridas que tanto caracterizam o estilo.

Para se fazer uma folha de Ukiyo-ê é necessário muita dedicação e cuidado, primeiro o desenho é feito a mão, posteriormente é gravada com um buril em uma matriz de madeira que vai ser utilizada para impressão. Para cada cor do desenho  exigi uma matriz diferente e utiliza um sistema de registro para que cada cor seja impressa em seu devido lugar. As tiragens giram em torno de 100 a 300 exemplares o que vai depender do desgaste da matriz.

Grandes mestres surgiram na era de ouro do Ukiyo-ê, Hokusay, Hiroshigui, Utamaro e Kunisada são alguns dos mais importantes. KatushiKa Hokusay talvez seja dentre eles o mais lembrando, é dele a famosa gravura “A grande Onda de Kanagawa”, integrante da série As trinta e seis vistas do Monte Fuji, bem como as Hokusay Manga que deram origem posteriormente aos quadrinhos japoneses. Ele também publicou várias Shungas, gravuras eróticas que embora proibidas faziam muito sucesso entre a população.

A ligação entre o Ukiyo-ê e a tatuagem se deu principalmente a partir da tradução por Bakin do Suikoden, um conto chinês do século XIV sobre as aventuras de 108 guerreiros que lutavam protegendo os mais pobres. O Suikoden  virou febre no teatro Kabuki e artistas com Kunyioshi e Hokusai foram convidados a produzir gravuras com o tema para o teatro. Alguns os heróis do conto como Byôtaichû Setsuyei e Kyumonryô Shishin tinham seus corpos cobertos de desenhos. Logo carregadores de palanquins, facínoras, bombeiros e gravadores de Ukiyo-ê começaram a estampar seus corpos com tattoos inspirados nesses heróis. O Ukiyo-ê então se torna a maior fonte de inspiração para a tatuagem japonesa.

Com a Era Meiji e a abertura do Japão para o ocidente, o Ukiyo-ê que estava em decadência na sua terra natal, cai no gosto da Europa. As folhas inicialmente chegam ao Velho Mundo embalando peças de porcelana e outras mercadorias mais logo se tornam objetos de desejos de colecionadores e    chama atenção de jovens artistas europeus, influenciando escolas tão diversas com o Impressionismo e o Cubismo.

Após a Segunda Guerra o estilo renasce no Japão a partir de jovens artistas e com a popularização e reconhecimento tatuagem japonesa ela deixa as folhas de papel e ganha o mundo gravando “os retratos de um mundo flutuante” na pele de pessoas dos cinco continentes.


Video mostrando o porcesso de Impressão do Ukiyo-ê




Grande Onda de Kanagawa por Hokusai




Sunga, gravura erótica por Hokusai



Gueisha por Utamaro



Guerreiro do Suikoden por Kunyioshi




Tatuagem feita por mestre Horiyoshi III com tema do Ukiyo-ê






Sóstenes Carneiro Lopes
Jornalista de formação, é tatuador no
 estúdio Mahadeva Custom Tattoo e 
Professor de Linguagem Visual na 
graduação em Arte e Midia /UFCG

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